Que se lixe a troika?
Até
parece que se trata duma potência invasora. Que se saiba, a troika veio a
pedido dum governo legitimamente eleito que foi apanhado “de calças na mão”, sem
crédito para se continuar a endividar
e sem dinheiro sequer para pagar
salários.
Um empréstimo indispensável
foi depois obtido, após negociações com os credores e com condições para a
recuperação económica, cujo cumprimento a Troika verifica desde então.
Que se saiba também, o governo
presente e também legitimamente eleito, mantém o rumo decidido nessa altura,
com medidas que podem ser discutíveis, mas para as quais tem a autoridade dada
por um mandato democrático.
Utilidade e oportunidade
A manifestação de hoje,
suposta ser de descontentamento com o governo e contra a troika, é neste
momento (em que a troika se encontra em Lisboa e se negoceia em Bruxelas), na
realidade uma excelente ajuda para o governo.
Quando forem anunciadas em
breve as medidas de apoio ao crescimento económico e ao emprego, o governo terá
que voltar a agradecer ao povo deste país, os sacrifícios, a paciência e a
forma ordeira como manifesta o seu descontentamento.
Não interessa que o Terreiro
do Paço estivesse meio cheio como dizem uns, ou meio vazio como dizem outros. O
que interessa é que povo tornou bem claro que está farto da austeridade
nacional, farto de suportar as consequências da austeridade nos outros países
europeus, farto da ausência de leadership de Bruxelas no caminho para a
federação, farto das consequências duma globalização económica injusta e descontrolada.
Os desesperados, os inconscientes e os hipócritas
Aparecem sempre nestas
manifestações as pessoas exasperadas, o que é de esperar e perfeitamente
compreensível. Contam as suas histórias de injustiça social e insurgem-se
contra verdadeiros casos de abuso e corrupção. Há os desempregados, os
empregados e reformados pobres, mas também os esbulhados por reduções de
salários e reformas, sem esquecer quem vê os impostos confiscarem-lhes a maior
parte do rendimento.
Mas aparecem também aproveitadores
sindicalistas e membros de partidos de protesto, à procura dum palco mediático
para repetirem as mesmas mantras do desemprego e da pobreza. Sem nenhumas
propostas de alternativas viáveis para que o país possa resolver os seus
problemas. Como se os problemas não fossem a preocupação de todos, responsáveis
políticos e cidadãos normais.
Menos normais são as
declarações de alguns políticos que foram ou deviam ser responsáveis, mas que pedem
a queda do governo, dizendo que perdeu a legitimidade e como tem maioria na
Assembleia só pode ser derrubado na rua. Como a maioria é resultante da votação
popular, devem querer um regime autoritário de geometria variável ou uma
democracia “à la carte”... Hipocrisias.
“Grândola, vila morena”, outra vez?
Durou pouco, esta terceira
republica portuguesa, que tanto foi desejada e esperada antes de finalmente
acontecer. O povo desta manifestação canta “Grândola, vila morena” de José Afonso,
com a emoção com que os seus antepassados esperavam a volta de D. Sebastião.
Má memória. Esquecidos dos
excessos do PREC, do falhanço total das nacionalizações e das ocupações, dos
bancos sem dinheiro, das indústrias falidas, das propriedades agrícolas
arruinadas, da inflação a reduzir os salários a esmolas de miséria obtidas a
crédito.
Esta república foi feita da
procura de todas as liberdades e todos os direitos, sem as obrigações e deveres
correspondentes. Foi feita com uma economia estatal e dirigista, de quem não
conhecia outro modelo que não fosse dependente de protecções e favoritismos.
Uma sociedade que criou uma geração mimada, incapaz de se tornar independente,
de tomar a iniciativa e de empreender. Com valiosas excepções, claro. Um país
que acabou falido três vezes, como não podia deixar de ser. Por isso teve que
chamar a troika, três vezes também.
Cuidado com a História
Que se lixe a troika? É
preciso cuidado com o que os desesperados e os inconscientes desejam. Portugal
tem um triste passado de mau pagador.
Houve matanças provocadas por
levantamentos populares para não terem que pagar as dívidas aos judeus. Houve
um tribunal da Inquisição que se apropriava dos bens de quem acusava, para
enriquecimento dos delatores, da Igreja e do Rei. Houve falsificação da moeda.
Um país que não aprende com a
História. Quando Filipe IV de França, em colusão com o Papa Clemente V,
destruiu os Templários para não ter que lhes pagar as suas dívidas, D. Dinis
deu-lhes protecção em Portugal e dessa boa acção nasceu a única época de ouro
da nossa história.
Das cinzas está a renascer a Fénix
No meio das cinzas em que a
crise económica tornou o país, está já a renascer um Portugal novo. Alguns já
se apercebem mas pouco se discute, no meio de tantas lamentações pela morte
anunciada e progressivamente cumprida do Portugal velho.
No curto período após do 25 de
Abril, Portugal passou pelas mesmas fases por que passaram os países comunistas
do Leste da Europa. Uma fase de nacionalizações e de experimentalismos, mas com
educação e protecção social para todos. Seguida doutra fase de desmotivação,
estagnação e o aparecimento duma nomenklatura privilegiada. Finalmente a fase
de colapso e o sacrifício duma geração durante as reformas de transição
política, económica e social indispensáveis.
Para quem estiver atento, já se
vêm brotar e desenvolver as empresas nascidas dos clusters universitários, as
novas tecnologias, os novos empreendedores. A emigração dos mais bem educados e mais audazes, pode ser
seguida da volta de gente mais bem armada profissionalmente e com menos complexos
sociais, mais exigente com a qualidade e mais interventiva politicamente. É
preciso que o país velho desapareça para que o país novo se torne viável.
JSR
Como sempre JSR dá-nos uma perspectiva lúcida e actual da sociedade portuguesa no percurso difícil dos solavancos do caminho, acompanhada pela Troika, referenciando outras ocasiões também difíceis da nossa história do passado, lembrando que as repetições das dificuldades tem muito a ver com os comportamento de cada um.Temos socialmente uma memória curta e aprendemos pouco com as lições já dadas.
ReplyDeleteAgora que os gritos de indignação esmorceram, chegou o momento de parar, acalmar e escutar. Recomendo qua abram o link para terem possibilidade de lerem um artigo de opinião, que é mais do que isso: é um relembrar de parcelas da história de Portugal. algumas que tiveram a sua origem em acontecimentos ocorridos noutros paises. Termina com um olhar de esperança para o futuro, que para muitos não passa de um caminho para o abismo que, existe com efeito, mas apenas para os mais fracos no momento actual.
ReplyDeleteAs manifestações anti-Troyka e os "grandoleiros" não me preocupam nem um pouco em si mesmos. O que me preocupa é perceber que 99% dessas peesoas não sabem o que fazer no depois da Troyka (se esta fosse embora) e os 1% que sabem, queriam tornar Portugal numa república socialista popular à imagem de uma Coreia do Norte, Cuba ou Venezuela.
ReplyDeleteTalvez que agora aqui por Macau (temporariamente) possa vislumbrar outros mundos e soluções que nós andamos a descobrir desde sempre. Se sempre soubemos dar a volta por cima, mesmo que fosse para bater com a cabeça logo na parede seguinte, acredito que mais uma vez nos iremos superar!
Então por Macau? Mesmo temporariamente, é uma boa ideia. Como vão as coisas por aí? Um abraço.
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