Talvez valha a pena começar
este post por uma “declaração de interesses”, neste caso mais propriamente uma
declaração de ausência de interesses. Qualquer partido ou coligação de partidos
que esteja no governo, tem uma margem muito estreita de autonomia na sua obrigação
de tomar as medidas necessárias para satisfazer os credores e evitar a
bancarrota total. Qualquer partido na oposição, tem que prometer aos eleitores “as
setenta virgens de Alá” para ganhar votos. Tanto a governação como a oposição,
podem ser mais ou menos inteligentes nos seus papéis. Para um observador
isento, esta governação tem sido mais equilibrada do que a oposição.
O regresso de Sócrates, Jorge
Coelho e outros, às grandes missas televisivas, coincide naturalmente com o
facto de que este país chegou ao grau mais baixo do misticismo político pateta.
A realidade deixou de ser realidade e muitos preferem viver numa terra do faz
de conta. As cabeças comentantes acreditam nas suas próprias especulações e já não
distinguem facto e ficção. Nesse universo paralelo o governo vai cair porque há
manifestações na rua, porque foi entregue uma moção de censura no parlamento, porque
o tribunal constitucional chumbará duas rubricas do orçamento, porque... porque
sim.
Sócrates, um dos mestres contemporâneos
do “voodoo” político, é naturalmente atraído a este terreiro das benzeduras,
onde as galinhas sem cabeça correm
desaustinadas no meio de encantamentos e sortilégios. Com maioria no
parlamento, o “voodoo” das moções de censura só funcionaria como “mau olhado”
e só para quem acredita nessas baboseiras. Se calhar pensam que como o actual
primeiro ministro vem de Massamá, terra dos “grandes feiticeiros africanos” que
metem papelinhos nas caixas do correio a prometer “arranjos” para problemas de
amor e dinheiro, o desgaste psicológico pode funcionar. Esperemos que não
funcione, porque num temporal qualquer comandante de navio é melhor do que um
comité.
O antigo primeiro ministro foi
estudar para Paris durante dois anos, mas não aprendeu nada nem esqueceu nada,
como dizia Talleyrand dos emigrados que tinham fugido da França durante o período
revolucionário. Como o homem não é estúpido, representa muito bem o papel do
idiota que continua a acreditar que o país não estava falido, que as estatísticas
se podem manipular sem verificação, que gritar mais alto que os outros os
convence em vez de os hostilizar. Como é que os jornalistas que o entrevistaram
se deixaram maltratar e reduzir a meros compères duma má comédia, não se percebe,
a menos que... Será espírito de missão?
Hoje no Expresso, o feiticeiro
emérito do “voodoo” nacional, achou a prestação “brilhante”. Não há como um vendedor
de ilusões para reconhecer o talento de outro. Ambos defraudaram as esperanças
dos crentes e os cofres do estado, mas nada os faz calar, nem o ridículo.
Já a volta de Jorge Coelho à
vida política é mais óbvia: sai da toca da Mota-Engil a mando do dono, o sumo-sacerdote
dos Espíritos, para defender os vários interesses da corporação, tais como as
rendas excessivas das PPP’s e outras coutadas protegidas. Benesses postas em
perigo pelas equipas dos ministérios das Finanças e da Economia, que começam a
morder as canelas dos interesses económicos, maçónicos e outros menos confessáveis,
que efectivamente mandam no estado. O governo é apenas mais um intermediário a
prazo, como são os partidos, os tribunais e outras instituições supostamente
independentes.
Todas as histórias têm a sua
moral. Aconteça o que acontecer, o circo tem que continuar.
JSR