Todavia, não há solidão maior do que aquela que
pode sentir quem regressa ao seu país de origem após um longo período de
ausência. Agora como em séculos passados. Mesmo que a recepção dos seus
compatriotas seja calorosa, mesmo que as amizades estejam intactas. A partir da
mesma base, os ciclos de vida levam a experiências diferentes e portanto a
construções mentais diversas, sejam convicções, hábitos ou opiniões. Restam
poucos interesses comuns, para além da nostalgia de um tempo em que todas as
esperanças eram permitidas.
Nos reencontros, comparam-se experiências e cada um
pergunta a si próprio como teria sido a sua vida se tivesse seguido o mesmo
caminho que aquele do colega de Escola, do amigo do Liceu ou do companheiro de
activismo político na Universidade.
Os que partiram, perguntam-se como seria ter
passado uma vida tranquila rodeado dos amigos no lugar onde nasceu, casar com
alguém que conheceu desde sempre, reunir a família aos Domingos e ver crescer
os filhos e depois os netos? Como seria ter seguido uma carreira profissional
no seu país e conseguir a respeitabilidade do professor, do médico ou do juiz,
ver os resultados materiais da criatividade do arquitecto, do músico ou do
artista plástico, ou ter o “panache” do marinheiro ou do militar?
Os que ficaram, interrogam-se como seria ter saído
do país e seguido uma carreira internacional, competir com os melhores cada dia
de cada ano, desgastar-se em viagens incessantes, ter uma casa aqui e outra
acolá, um filho em cada lado, ter que planear os encontros de família como se fossem
cimeiras ?
A relva parece sempre mais verde no jardim do
vizinho... Por isso alguns ficaram partindo, ou seja, partiram ocasionalmente
em comissões de serviço diplomáticas, militares ou académicas.
Voltar às origens é sempre um processo difícil, a
adaptação é demorada, sempre incompleta e por vezes conflituosa. Os
estrangeirados não se podem impedir de avaliar os acontecimentos duma
perspectiva global, por isso têm alguma dificuldade em compreender as
controvérsias estritamente nacionais ou as angústias nas decisões de carácter
local. O maior handicap está em encontrar pontes de comunicação com quem ficou,
devido à importância diferente que cada parte dá aos acontecimentos e à forma
como se podem resolver.
A quem está numa perspectiva nacional todas as
dificuldades parecem originais, únicas, extraordinárias. Quem tem uma
perspectiva mais vasta pode ter conhecido situações semelhantes e daí
extrapolar para o que pode acontecer e quais as alternativas. Mas é sempre
difícil fazer passar a mensagem. Veja-se o que se passa presentemente com os
ministros das finanças e da economia, com o conselheiro do governo António
Borges e muitos outros menos mediáticos.
Existem de facto “ventos da história”, como existem
ciclos económicos, como existem acontecimentos imprevistos e “cisnes negros”.
Para um português estrangeirado, voltar e encontrar o seu país em crise é só
mais uma, não só historicamente mas até durante o período duma vida. Todos os
países têm crises, duma natureza ou doutra. Mas nada é permanente, tudo acaba
por passar.
O que é importante, é que tanto os que ficaram como
os que voltam, tenham a humildade e sabedoria de aceitar que cada um tem a sua
chave, de peso igual, para abrir as portas do reencontro. Seja apenas para ter
a satisfação de trocar as histórias das memórias comuns, das pessoas, dos
lugares, dos sabores, dos cheiros e das vistas partilhadas. Seja para avaliar o
que mudou e ainda bem, o que devia ter sido feito e não foi, o que devia ser
protegido e se estragou. Em qualquer dos casos, participar para conseguir
melhor.
JSR
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