A China é tradicionalmente representada por um dragão, como a Grã-Bretanha por um buldogue ou a Rússia por um urso. Lembro-me de em criança ter tido um mapa da Europa onde cada país era representado por um animal.
Depois de séculos duma presença residual em Macau, são os chineses que têm chegado paulatinamente a Portugal. Primeiro, invadiram o pais com lojas de produtos a preços que destroem toda a concorrência. Agora, com a compra das acções do estado na EDP, abrem o caminho a outras participações importantes na economia nacional, no acesso aos mercados europeus e aos países de língua portuguesa.
O dinheiro não tem cheiro e raramente tem nacionalidade. Acontece que esta é uma das ocasiões em que tem. Os investimentos dum país governado por uma ditadura de partido único, onde a nomenclatura é efectivamente uma classe oligárquica acima do povo, são mais do que investimentos de capital, são instrumentos de politica internacional.
A 23 de Janeiro começa também o ano do dragão no calendário da astrologia chinesa. A sabedoria de Confúcio e a precaução negocial dos mandarins que se confrontaram com os bárbaros que chegavam ao Império do Meio, recomendavam que mesmo não acreditando nas crenças dos outros é necessário conhecê-las. Ou seja: estar a par do que acredita quem acredita, a fim de compreender como pensa e como decide quem decide. Parece uma chinesice mas não é, talvez seja útil ler a frase outra vez. Por crenças não se referiam à astrologia, na qual os chineses acreditavam e acreditam, mas aplicaram o termo às novas ideias e religião trazidas para a China pelos portugueses e outros europeus.
Embora o conselho seja sempre útil, chegou agora a altura em que se torna uma questão de sobrevivência para Portugal tomar as devidas precauções e as medidas de contenção necessárias. A China é uma máquina de produção para a exportação, que manipula o cambio da sua moeda a fim de manter as importações o mais caras possíveis e as exportações subsidiadas. Com custos mínimos de mão de obra e sem preocupações de solidariedade social, pode investir os lucros da economia no poder do estado dentro e fora das fronteiras, na perpetuação do regime e na qualidade de vida dos membros do partido e das forças armadas. O povo, tanto invocado pelas utopias comunistas, não tem nem voz, nem voto, nem benefícios sociais, e só partilha pouco e muito lentamente da prosperidade do pais.
Duma forma pragmática, todo o investimento é bem vindo. Vale a pena recordar que os xeques árabes enriquecidos pelas nacionalizações das companhias petrolíferas, investiram o seu dinheiro nos países dessas mesmas companhias, em Londres, em Paris, em Nova York. Beneficiaram todas as partes envolvidas. Mais tarde, a venda das torres de La Défense em Paris ajudou o Kuwait a pagar o esforço de guerra americano para derrotar a invasão pelo Iraque. Da mesma forma, a compra da dívida americana coloca vendedores e compradores com interesse igual na defesa do dólar.
É preciso que fique claro que a invasão pacífica pela China tem consequências importantes para Portugal, não só na economia onde até podem ser benéficas, mas também nas relações internacionais, onde o seu peso vai mudar as teias de interesses existentes, constituídos na Europa como no resto do mundo. Essas consequências têm que ser antecipadas e bem analisadas, para que a dinâmica desta nova situação possa ser usada em proveito nacional e não apenas para satisfazer ambições pouco recomendáveis.
JSR
Este artigo do John Gapper no Financial Times ha dias e' relevante -- em que direccao ira a China depois das mudancas de governo este ano?
ReplyDeletehttp://www.ft.com/intl/cms/s/0/29d9a400-36c6-11e1-b741-00144feabdc0.html#axzz1j4ZSFkNj
Como Gapper e outros, penso que o Comité Central deveria preparar um "soft landing" económico para evitar explosões sociais, mas que a sua própria rigidez não vai conseguir impedir um "hard landing" de consequências imprevisíveis.
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