Seven Sages and a Sphere (Roman mosaic) |
Published 13/10/2011 by "Jornal do Fundão".
O presente governo de Portugal tomou posse a 21 de Junho 2011. Faz cem dias por agora, um período geralmente aceite como razoável para uma primeira avaliação da capacidade de cumprir as promessas eleitorais e de implementar as medidas correspondentes.
O presente governo de Portugal tomou posse a 21 de Junho 2011. Faz cem dias por agora, um período geralmente aceite como razoável para uma primeira avaliação da capacidade de cumprir as promessas eleitorais e de implementar as medidas correspondentes.
Esqueçamos todo o barulho de fundo que houve entretanto, das oposições parlamentares, das associações de interesses, dos cidadãos mais afectados pelas primeiras medidas restritivas e obviamente dos media, cujas funções incluem encher tempo e espaço, com mais ou menos responsabilidade social.
Cem dias. O tempo necessário para definir um mandato, o período em estado de graça que deve ser aproveitado para fazer passar a legislação e tomar as decisões mais difíceis e mais controversas. Quais são as avaliações prevalentes sobre a performance do governo de Portugal?
Observando de Washington, neste período de reuniões anuais do Fundo Monetário e do Banco Mundial (a visão de Bruxelas não é muito diferente), há boas e más notícias.
As boas notícias são que os membros da “troika” agradecem aos deuses por lhes ter dado Portugal neste momento. Um país onde a população, os sindicatos e mesmo os pequenos partidos populistas, protestam como é natural contra os sacrifícios impostos pela austeridade que foi aceite como condição dos empréstimos, mas protestam civilizadamente. Um governo sério e sem convulsões na coligação partidária, com técnicos competentes e sem peias ideológicas nos ministérios mais importantes, que cumpre os acordos com as adaptações que considera apropriadas, que está a fazer as reformas que há muito se sabia serem necessárias mas que vinham sendo adiadas sine die. Em resumo, a “troika” pode defender-se dos ataques de quem considera as suas medidas irrealistas, exibindo um país que é tudo o que a Grécia não é.
As más notícias são que os mercados, as agências de avaliação e todos aqueles que sabem ver para além do curto termo, são uns desconfiados sem tempo para discriminações temporárias. Se a Grécia vai à bancarrota, e desde o princípio da crise que é evidente que vai, toda a periferia Sul da zona Euro é suspeita de poder ir também, por arrastamento progressivo. Porque a crise financeira é a parte mais visível mas menos importante do iceberg, com juros menores e mais tempo acaba por ser do interesse tanto dos credores como dos devedores negociar um pagamento parcial. Subjacente está a parte mais perigosa e mais difícil de resolver, a perda da competitividade económica.
Os países da Europa e os Estados Unidos partilham estes mesmos problemas. São economias desenvolvidas que deixaram partir as indústrias mais utilizadoras de mão de obra para as zonas do mundo em desenvolvimento, onde essa mão de obra é mais barata, tem menos exigências e menos custos sociais. São consumidores que se embriagaram com os produtos baratos importados desses mesmos países em desenvolvimento e que aproveitando os juros baixos dos empréstimos se endividaram sem freio. Agora, os governos não sabem o que fazer com as legiões de falidos e desempregados, nem como sobreviver sem o seu consumo e sem os seus impostos, mas com os seus custos de apoios sociais acrescidos.
Como todos os poderosos e ricos que empobrecem mas não conseguem abdicar dos hábitos de domínio e de esbanjamento, os Estados Unidos sobretudo, mas a Europa também, continuam a tomar sobre si as responsabilidades de segurança e de apoio ao desenvolvimento de regiões do mundo onde há países mais ricos do que eles. Há importantes interesses geoestratégicos em jogo, mas os custos têm que ser mais bem repartidos.
A economia internacional, como a política e o direito, não se jogam em tabuleiros equilibrados. São o domínio das circunstâncias em mutação.
De qualquer forma, é ridículo ter considerado até recentemente a China um país subdesenvolvido, recebendo todos os tratamentos preferenciais inerentes a essa classificação, quando já prosseguia um programa de exploração espacial, ou aceitar agora que mantenha o valor da moeda artificialmente baixo como subsídio às exportações, para depois utilizar os excedentes financeiros como armas de guerra económica.
Na Rússia, como na China, os sucedâneos dos partidos “comunistas” apropriaram-se de todos os recurso do Estado e estão cada vez mais ricos, mantendo a população pobre e explorada. Outros regimes autoritários no Médio Oriente produtor de petróleo, onde antigos chefes tribais se apropriaram dos recursos naturais comuns para exclusivo proveito próprio, são factores explosivos de instabilidade social e económica. Como se viu com a invasão do Kuwait pelo Iraque e se continuará a assistir com as revoltas das populações árabes que estão a varrer toda a região.
Também é, não só caro como imoral, ceder a chantagens para custear a sobrevivência de certos países desgovernados ou mesmo inviáveis da África, enquanto os nababos desses mesmos e doutros países da região, vivem numa ostentação agressiva e investem os recursos dos seus países em proveito pessoal. É evidente que tudo isto é temporário, à medida que os regimes exploradores caem, os novos governantes perseguem os anteriores nos tribunais e nas contas bancárias.
Os tempos mudaram, os Estados Unidos têm que se habituar a avaliar, negociar e dosear melhor os esforços, como qualquer organismo que se sabe adaptar e envelhecer com dignidade. Os países da Europa têm que esquecer os traumas da geração passada e juntar forças sem hesitações numa entidade comum, simplesmente para conseguirem sobreviver como sociedades prósperas e justas.
No seu canto, Portugal tem que continuar a fazer as reformas necessárias para que a sua economia se torne competitiva o mais rapidamente possível. A gestão da bancarrota grega e as dificuldades dos outros países do Sul, estão a obrigar a decisões importantes na Europa do Euro, com consequências que o governo português terá que saber aproveitar no momento próprio. O capital de confiança ganho pela seriedade com que serão feitas as reformas vai ter que ser aproveitado para renegociar a dívida, de forma a que o seu peso não asfixie durante muito mais tempo a possibilidade de crescimento da economia. As características que terá essa renegociação e o nome que lhe for dado, não interessam. O importante é que o país continue no Euro, que a sua economia se articule tão vantajosamente quanto possível com as outras economias europeias, que a sua balança comercial se equilibre e que a grande maioria da população encontre trabalho condizente com as suas reais capacidades, embora não necessariamente com alguns diplomas sobrevalorizados.
Os próximos cem dias vão ser mais excitantes e mais decisivos do que estes primeiros. Apertem os cintos e vamos todos enfrentar as turbulências com confiança e de olhos bem abertos, para conseguir distinguir as aparências da realidade.
JSR
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