"Webs" by Shannon Rankin |
Assistir ao documentário de que toda a gente tem falado, finalmente e em Nova York. Ver desfilar no écran uma porção de pessoas conhecidas de longe ou de perto, assim como vários antigos colegas. Sair da sala e encontrar-se rodeado das instituições mencionadas e dos lugares descritos ou entrevistos nas imagens. Quais são as sensações? Desconforto, irritação, náusea.
Desconforto, porque se trata dum bom trabalho de investigação de factos recentes e das suas consequências. Mantendo o carácter multicultural do documentário, pode-se dizer ironicamente que... teve uma montagem orientada e com agenda, “cousus de fil blanc”; que é fácil ver os erros cometidos depois de acontecerem, como “a Monday-morning quarterback”; que os responsáveis de certos países mostraram uma “schadenfreude” de que em breve se irão arrepender. Além disso, para tornar as situações descritas compreensíveis para a maioria dos espectadores, foi preciso recorrer a uma simplificação excessiva, que pinta os personagens a preto e branco, os bons e os maus. Alguns são realmente como os pintam, mas a maioria dos que são apresentados como completos idiotas, tiveram as suas declarações obviamente editadas, truncadas e provavelmente nem sempre foram citados em contexto. Infelizmente, alguns dos principais actores destes acontecimentos recusaram participar no documentário. Os seus pontos de vista e justificações, que entretanto apareceram noutros meios de comunicação, teriam contribuído grandemente para esclarecer situações e decisões que assim parecem incompreensíveis.
Irritação, porque vários profissionais, alguns em lugares de grande responsabilidade, começaram a alertar a tempo acerca dos perigos iminentes e não foram escutados por quem tinha a obrigação de estar atento e tomar medidas para evitar estes desastres. Ou melhor, esta cadeia de desastres. Porquê? Porque efectivamente existe uma teia de interesses incestuosos entre universidades, instituições financeiras públicas e privadas, reguladores federais e estatais, Bancos e outras empresas, lobbies e legisladores, contribuições para campanhas e poder politico. A igualdade diante da lei é um mito. Um mito necessário e útil, como outros mitos, para manter a crença na comunidade de interesses e na solidariedade social. Mesmo em democracia, embora este seja o único regime politico que, além de declarar essa igualdade como um objectivo, se esforça realmente por o alcançar. Mas que só o consegue de forma muito relativa.
Náusea, porque após a aparente surpresa e o susto real, não se consegue mudar grande coisa em termos de regulação. Depois dos desastres reais das falências de estados e instituições, do afundar das bolsas de valores, da perda das economias aí investidas, da ruína de empresas e famílias, do aumento do desemprego, das perdas dos fundos de pensões que não conseguem pagar as reformas previstas... houve uma avalanche de medidas propostas para aumentar os controles e evitar repetições. Mas essas medidas não foram aprovadas, ou só foram aprovadas parcialmente, pelos legisladores. Com o sentimento de injustiça sentido por todas as vítimas e pela maioria dos cidadãos votantes, como é isso possível? Em vez de medidas eficazes, como de costume foram encontrados alguns bodes expiatórios, os mais dispensáveis, os menos protegidos pela teia de interesses que constitui todas as oligarquias, de todos os países, de todos os regimes.
Conclusões? Algumas. Os sistemas político, económico e financeiro, assim como as nomenklaturas que os alimentam e dos quais se alimentam em prioridade, tornaram-se indispensáveis. Os governos têm que ir buscar os seus ministros e conselheiros ao mesmo grupo de gente que estabelece as teorias, ensina os modelos, implementa os paradigmas, faz a prosperidade e ocasionalmente comete as asneiras, corrige os erros mais abstrusos e... assegura a permanência do sistema geral de funcionamento dos estados. Há alternativas? Há, mas todas as que já foram experimentadas deram resultados piores, por vezes monstruosamente piores.
JSR
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