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Triumph of Fame - Pieter Coecke van Aelst |
Published 11/11/2010 by “Jornal do Fundão”
O prestígio das nações manifesta-se de muitas formas, uma das quais é a credibilidade, esta resultando de factores objectivos, subjectivos e históricos. Portugal está em crise de credibilidade junto dos mercados financeiros internacionais. Outra vez. Talvez seja oportuno perguntar quando é que Portugal não esteve em crise durante a sua história recente. Raras vezes. Políticos, economistas e comentadores, consideram que o país está a ser injustamente vitimado pela especulação financeira. Injustamente e especulação, são avaliações subjectivas para os factos objectivos de que o país está excessivamente endividado e de que existem dúvidas acerca da sua capacidade de pagar o que deve. Não só entre os credores das que já contraiu, mas sobretudo entre os possíveis investidores acerca dos empréstimos que continua a precisar de contrair.
Os portugueses consideram nas sondagens que estão agora a viver pior, que há mais desemprego, que o Estado os abandona e que os governantes só se preocupam com os seus interesses pessoais. Esta avaliação depende da data a partir da qual a comparação é feita, mas em todo o caso, os que respondem às sondagens só se podem estar a referir à prosperidade artificial criada pelos fundos de coesão e pelo crédito fácil após a entrada na Comunidade, agora União Europeia.
A economia funciona nesta altura com “balões de oxigénio” do Banco Central Europeu, porque os Bancos portugueses já não se conseguem financiar nos mercados. O Bundesbank já fez conhecer as condições para continuar a ser o lender of last resort da União. Mas a grande preocupação nacional parece ser a possível volta do FMI e da disciplina imposta como “condicionalidade” para os seus empréstimos. Todavia, com essa garantia de supervisão restaura-se uma parte de credibilidade, embora pequena e transitória. Porque entretanto, vai ser preciso explicar porque não têm sido feitas as reformas necessárias para o crescimento da economia. E sem crescimento da economia não há credibilidade nenhuma.
Estas considerações poderiam continuar indefinidamente, mas vale a pena juntar um pouco de análise.
Não existe igualdade entre os países a não ser na teoria retórica dos tratados. Fora condições excepcionais, ninguém no seu perfeito juízo consideraria que têm a mesma credibilidade a Rússia e os Estados Unidos, o Irão e a França ou a Nigéria e o Japão. Existe efectivamente uma hierarquia de países que informa o julgamento daqueles que tomam decisões de carácter internacional.
Todos conhecem as distinções entre os vários graus de desenvolvimento, de poder militar e económico, de influência cultural e também de capacidade de incomodar (the nuisance factor...). Daí que não sejam efectivamente tratados da mesma maneira os países que enfrentam dificuldades semelhantes. Os mais poderosos fazem mudar os critérios que não conseguem cumprir, os mais fracos têm que cumprir rigorosamente as regras. No caso de incumprimento, a guilhotina cai primeiro sobre os países menos credíveis nas suas promessas de reentrar na ordem sem o incentivo duma autoridade exterior como o FMI. Para a classe politica de alguns países, la peur du gendarme est le début de la sagesse...
A Grécia perdeu a credibilidade porque tem falsificado as suas estatísticas, tem abusado das politicas europeias de coesão, permite níveis de endividamento público incomportáveis para financiar infra-estruturas e serviços eivados de corrupção, pensões em idades ridiculamente baixas, um fisco incapaz de combater a fuga generalizada aos impostos e por aí fora. Hoje, quando se pensa na credibilidade da Grécia em termos económicos, não conta o facto dos seus antepassados terem criado a cultura que está na origem da nossa civilização ocidental, mas todos pensam nos muitos séculos em que o país foi uma província do império otomano e da influência que isso teve na sua forma actual de estar no mundo.
Em relação a Portugal o défice de credibilidade é menor do que o dos gregos, as estatísticas são mais fiáveis, a classe média mais honesta (e por isso mesmo taillable et corvéable à merci pelos sucessivos governos) e ninguém duvida da competência dum grupo considerável de profissionais com exposição internacional. Por outro lado, o endividamento tem sido imprudente, a corrupção chega ao mais alto nível, a justiça é demasiado lenta, a produtividade baixa e a educação laxista. Também ninguém toma em consideração o papel do país na descoberta do mundo durante o renascimento europeu e o primeiro mercado global, a não ser nas cortesias diplomáticas, mas todos os decisores que contam sabem dos longos anos em que o país foi efectivamente um protectorado britânico, da desordem recorrente das finanças interrompida apenas durante o consulado salazarista e da incapacidade atávica de manter a coerência no desenvolvimento económico.
Por isso Portugal vai continuar a ser injustamente tratado pelos mercados. Só deixará de o ser quando tiver uma política económica sustentável e as finanças equilibradas. Quando tiver uma legislação laboral e um mercado de habitação, competitivos e livres de interferências ideológicas. Quando tiver uma justiça eficaz, um sistema educativo que reconheça o mérito do esforço individual, quando as protecções social e de saúde forem proporcionais aos meios e às necessidades. Para que tudo isso possa acontecer é indispensável que os cidadãos sejam mais instruídos, responsáveis, produtivos, empreendedores e lúcidos nas suas escolhas politicas. Entretanto, o retorno do FMI seria o menor dos males que esperam o país durante estes próximos anos difíceis.
Notas:
Outro dos factores de prestígio de cada pais é a imagem projectada pela maioria dos seus cidadãos através dos media, das relações comerciais ou turísticas e dos seus residentes no estrangeiro. É importante para o reconhecimento exterior dum país com pouca população, que consiga ter alguns dos seus nacionais nos mais importantes centros de decisões internacionais. Como são o presidente da Comissão Europeia, o director para a Europa do FMI ou um vice-presidente do Banco Central Europeu. Assim como são importantes os cientistas ou os artistas de valor. Mas a imagem de Portugal e dos portugueses é dada sobretudo pelas grandes comunidades emigradas. Gente trabalhadora, desembaraçada e que se integra facilmente, mas em geral com pouca instrução, pouca participação politica e portanto fraca consideração social nos países de acolhimento. Por isso as excepções não têm grande consequência, precisamente por serem entendidas como excepções. Embora possa ser agradável para a auto-estima de alguns que o melhor treinador ou o melhor jogador de futebol do mundo sejam portugueses, o que aumentaria realmente o prestígio do país seria se a selecção ganhasse campeonatos...
JSR